Os versos são esperançosos, com um que de palestra motivacional, ao estilo Charlie Brown Jr. Os cantores, dois nomes fortes do pop atual: o pagodeiro Thiaguinho e o rapper Projota. Mas "Alma e Coração", música escolhida como tema dos Jogos Olímpicos do Rio, foi composta a partir do olhar de funkeiro: o jovem MC Léo da Baixada, de São Vicente (SP).
Ele venceu um concurso que contou com 42 concorrentes do Brasil, de estilos e mensagens variadas. Composta em parceria com Victor Reis e Rodrigo Marques, produtores de MC Guimê, a faixa ganhou novo arranjo, mais produzido e sintético, a cargo do duo eletrônico brasileiro Tropkillaz.
Léo, que vê na escolha de sua música a conquista definitiva do funk, aprovou a versão, que mistura elementos do funk, pop e rap. Mas sua intenção inicial era outra. "Eles pegaram para fazer algo mais de animação. Para jogar o Brasil para cima, claro. Acho que a música tinha que ser mais para tocar o coração das pessoas e motivar. Mas ficou muito f***, irmão."
Segundo Léo, a música nasceu de uma sugestão de Reis e Marques, logo após produzirem juntos o hit "Se Empenhar". Eles queriam uma letra ainda mais radiofônica, com ares de "skate e praia" e menos gírias.
Lançada há um ano e meio, "Alma e Coração" acabou seduzindo o estafe da gravadora Som Livre, responsável por escolher as concorrentes à música tema dos Jogos e, junto ao COI (Comitê Olímpico Internacional), definir a vencedora.
Trechos como "fazer acontecer, lutar e conquistar/ mantenho a fé pra caminhar/ e assim eu vou" pareciam escritos sob medida para um novo hino jovem. "O 'Baile de Favela' [de MC João] estourou, e eles vieram procurar meu escritório", revela MC Léo.
"Meu empresário, então, mostrou 'Alma e Coração', e eles falaram: 'Mano, essa é a música que estamos precisando para as Olimpíadas. Ela é de motivação. É jovem. Representa muito o que precisamos'."
Por razão contratual, a versão original de MC Léo teve de ser retirada de todas as plataformas da internet após o lançamento da música oficial, no último dia 3 de julho. Todo o processo de escolha demorou cerca de oito meses.
"Eles tinham muitas músicas boas, mas com temas meio velhos. Falando de sol, de natureza, de como o Brasil é lindo. São coisas saturadas já", lembra o MC. "Mas não foi fácil. A música veio e voltou. Uma hora achamos que nem seria mais escolhida. Mas no final deu certo."
Mais do que dinheiro
À espera da Olimpíada, e agora de um eventual contrato com a Som Livre, Léo ainda não sabe se estará na cerimônia de abertura no Rio no próximo dia 5 de agosto. Atualmente, ele excursiona pela América do Sul em países como o Paraguai e Bolívia.
Nesses shows, vem sendo anunciado como "o autor do tema da Olimpíada", algo que não significa necessariamente mais dígitos na conta bancária. Pelo contrário: o funkeiro diz que não recebeu um centavo por ter vencido o concurso.
"Nem sei dizer qual é a sensação, porque ninguém no funk chegou a esse nível antes, de ter uma música escolhida lá fora e virar um patrimônio do Brasil", afirma o jovem de 24 anos, que tem dez de carreira e dois discos independentes no estilo "ostentação".
Para ele, o preconceito do brasileiro em relação ao funk ainda é notório e incomoda. "Já consegui estourar com outras músicas. Hoje tenho casa própria, tenho meu carro bom. Tudo fruto do meu trabalho. Mas não ligo. Nem tudo é dinheiro. Agora a gente quer é marcar nosso nome com a música."
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