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Aplicativos de celular são as novas armas no combate à depressão

(foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)
O mundo vai ao banco pela internet, pede comida pela internet. Participa de reuniões, se comunica com a família e estuda pela internet. Nada mais natural que essa imersão na tecnologia seja estendida aos cuidados com a saúde. Tirando proveito da facilidade de acesso e da ampla disponibilidade de redes Wi-Fi e dos aparelhos móveis, pesquisadores investem em plataformas e softwares que auxiliem pacientes com transtornos mentais como a depressão, doença que afeta 300 milhões de pessoas e é principal causa de incapacidade no globo.

Se até pouco tempo atrás havia desconfiança sobre a validade dessas ferramentas, estudos mostram que, aliadas ao tratamento convencional, elas podem ser efetivas. A ideia dos aparatos tecnológicos não é substituir os profissionais de saúde, mas complementar o tratamento, atingindo o paciente nos pontos em que a abordagem tradicional não tem surtido efeito ou não consegue chegar.

É o caso do Outcome Feedback (retorno de resultados), desenvolvido por pesquisadores europeus, sob a liderança do instituto Wellcome Trust, da Inglaterra. “Os pacientes que não respondem bem à terapia geralmente largam o tratamento depois de poucas sessões. Essa tecnologia que desenvolvemos identifica problemas precocemente com precisão e permite que os terapeutas fiquem mais afiados com as dificuldades e os obstáculos que os pacientes precisam enfrentar”, explica o psicólogo Jaime Delgadillo, da Universidade de Sheffield. Ele conta que o sistema usa o feedback do usuário para identificar rapidamente aqueles em risco de piora, o que faz por meio do rastreamento dos sintomas como interrupção no ciclo de sono, perda de apetite, sensação de cansaço, dificuldades para relaxar, entre outros.

Neste mês, Delgadillo publicou, na revista The Lancet Psychiatry, um estudo sobre a tecnologia realizado com mais de 2 mil pessoas em oito centros de tratamento para a depressão na Inglaterra. Com informações semanais dos sintomas em mãos, fornecidas pelo paciente por questionários on-line, o terapeuta insere os dados em um software, que gera gráficos mostrando alterações do nível sintomático do usuário. O aplicativo tem um algoritmo que compara o estado de ânimo da pessoa com o que seria esperado para aquela etapa do tratamento e avisa o psicólogo caso a resposta esteja aquém do esperado. Dessa forma, o especialista pode intervir, promovendo mudanças no atendimento. No estudo, o uso do software reduziu em 74% a probabilidade de o paciente piorar e, assim, abandonar o acompanhamento profissional.

Uma das vantagens das ferramentas tecnológicas é poder acompanhar o paciente 24 horas por dia, oferecendo uma rápida resposta, algo impossível de ser feito pelas vias convencionais. A maioria dos aplicativos de celular na área da saúde mental explora essa funcionalidade, e os resultados de estudos indicam que, sendo amparado em tempo real a qualquer momento, o paciente tem mais chances de melhorar, além de aderir mais ao tratamento. “No caso daqueles que têm indicação de acompanhamento semanal, podemos perder até metade dos pacientes quando pedimos que venham à clínica com frequência”, explica Dror Ben Zeev, professor de psiquiatria e ciência comportamental da Universidade de Washington. “Dependendo da qualidade, uma abordagem móvel pode ser não só mais acessível, mas clinicamente tão útil quanto sessões de terapia em grupo conduzidas pessoalmente.”

Adesão alta


Zeev é autor de um estudo publicado recentemente na revista Psychiatric Services que avaliou um aplicativo chamado Focus, voltado a pacientes de depressão severa, transtorno bipolar e esquizofrenia. Dos 163 que participaram da pesquisa, 90% utilizaram o app ao menos uma vez. Ao mesmo tempo, somente 58% compareceram à sessão de terapia em grupo nessa mesma frequência. Segundo o psiquiatra, a maior vantagem da ferramenta é a conveniência de ter disponível o atendimento em qualquer lugar e a qualquer momento, algo que, lembra Zeev, é essencial quando se sofre com sintomas como alucinações, alterações de humor e abuso de medicamentos, entre outros.

“As doenças mentais graves afetam aproximadamente 4% da população. Com o suporte apropriado, essas pessoas podem ter vidas produtivas e satisfatórias. Porém, o momento em que mais precisam gerenciar a doença geralmente é aquele em que elas evitam procurar ajuda, pois têm medo de ser estigmatizadas e rotuladas ou mesmo pela dificuldade de acesso a clínicas”, afirma. O Focus é uma intervenção voltada para pacientes com esse perfil, que oferece um aplicativo e assistência de especialistas em saúde mental.

O sistema inclui questionários pré-programados de avaliação diária de sintomas e funções sob demanda, que podem ser acessadas 24 horas por dia. Dependendo dos sintomas apresentados, o app oferece estratégias de controle, como técnicas de relaxamento e higiene do sono, reestruturação cognitiva para ideação persecutória (quando a pessoa acha que está sendo perseguida), manejo de humor, entre outras. Toda semana, especialistas fazem ligações breves para prestar assistência técnica e clínica.

No estudo, parte dos participantes foi destinada às sessões semanais de terapia, e parte ao tratamento com o Focus. Ao fim de oito semanas, 40% do primeiro grupo concluíram o tratamento, contra 56% do segundo. As duas intervenções foram bem avaliadas pelos pacientes. “Esse estudo reforça a ideia de que aplicativos móveis podem desempenhar um importante papel nos sistemas de saúde do século 21”, avalia o psiquiatra.

Diálogos simulados


No Brasil, o uso da tecnologia no manejo da saúde mental ainda engatinha. Mas, de acordo com o psiquiatra Irismar Reis de Oliveira, professor e pesquisador da Universidade Federal da Bahia, a ideia é bem-aceita pelos profissionais da área (Leia entrevista). Recentemente, chegou ao país o Deprexis, uma plataforma interativa desenvolvida por pesquisadores europeus para auxiliar no tratamento da depressão leve e moderada. O programa permite a simulação de um diálogo com o paciente. Dependendo do que é respondido, o programa traz explicações e ilustrações, incentivando a pessoa a fazer alguns exercícios por meio de áudios, textos e vídeos.

“O conteúdo do diálogo inclui tópicos explorados principalmente pela terapia cognitiva tradicional, mas também por outras intervenções psicoterápicas. Entre elas, podemos citar psicoeducação, ativação comportamental, solução de problemas, relaxamento e intervenções da psicologia positiva”, explica Oliveira. “Por enquanto, o Deprexis foi desenvolvido e testado apenas para auxiliar no tratamento da depressão, porém, vejo potencial de utilização em vários outros problemas, como os transtornos de ansiedade”, afirma. O programa foi avaliado por mais de 10 estudos, que atestaram a sua eficácia. Um deles, publicado na revista Plos One no mês passado, relatou a redução de sintomas depressivos e de dependência em pessoas com adição em jogos.

Duas perguntas /Irismar Reis de Oliveira


O senhor participou de uma mesa redonda no Congresso Brain 2018, em Gramado (RS), que debateu se os psiquiatras estão preparados para adicionar as ferramentas tecnológicas no tratamento dos pacientes. Qual foi a conclusão?
Durante o Congresso do Cérebro 2018, a ferramenta on-line para o tratamento da depressão Deprexis foi lançada oficialmente. Ficou evidente o interesse em ter mais uma ferramenta auxiliar eficaz no combate aos sintomas depressivos. Uma vez que mais de uma dezena de estudos clínicos publicados em revistas especializadas dão conta de sua efetividade, a conclusão foi de que o Deprexis se apresenta como um acréscimo às abordagens existentes, complementando, e não competindo, com os medicamentos e a psicoterapia presencial realizada pelos terapeutas.

A utilização de tecnologias no tratamento de pacientes com transtorno mental é recente e, mesmo nos Estados Unidos, onde a prática tem mais força, ainda há uma certa resistência. O que já se tem de evidência científica que valide essas ferramentas? 
Em um dos capítulos de meu livro publicado pela Editora Routledge, nos Estados Unidos, e traduzido para o português pela Artmed (Integrando psicoterapia e psicofarmacologia), John Greist, autor do capítulo, conta a história do primeiro estudo comparando psicoterapia feita pelo computador com aquela realizada por terapeuta. Esse trabalho foi concluído em 1983, porém, só foi publicado sete anos mais tarde. A autora desse trabalho, Paulette Selmi, encontrou grande resistência e desconfiança até convencer o American Journal of Psychiatry a publicá-lo. Seu trabalho mostrava resultados equivalentes em ambos os grupos, ou seja, a terapia por computador e a terapia realizada pela terapeuta tiveram resultados semelhantes. De lá para cá, vários softwares e aplicativos foram desenvolvidos para auxiliar no tratamento de transtornos psiquiátricos. O Deprexis é um deles, pelo que tenho conhecimento, o primeiro no Brasil para depressão
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