Os obstáculos sempre estiverem presentes na vida do engenheiro da
computação Junior Prado, de 31 anos. Ele nasceu com paralisia cerebral
e, com o apoio do pai, conseguiu aos poucos se adaptar aos estudos.
As dificuldades o incentivaram a ajudar pessoas com deficiência motora a
enfrentar as mesmas barreiras.
Recém formado em mestrado, no curso de Engenharia Elétrica e de
Computação, no Campus da Universidade Federal do Ceará (UFC) em Sobral,
Júnior Prado desenvolveu três dispositivos que melhoram a vida de quem
tem deficiência motora e, assim, possibilitam a independência no uso do
computador.
Prado descreveu a maneira como a vida escolar o motivou a desenvolver
projetos. “As escolas não aceitavam pessoas com deficiência, na época.
Meu pai tentou várias delas, e acabaram indicando a Apae de Sobral.
Na triagem, a médica disse que, no meu caso, não seria interessante
estudar lá. Eu poderia receber atendimento médico nas áreas
de fonoaudiologia, fisioterapia e terapia ocupacional, porque o meu
sistema cognitivo não tinha sido afetado. Assim, eu deveria ter aulas em
escolas regulares. Meu pai voltou a tentar e conseguiu me matricular em
uma escola particular pequena e eu comecei a estudar com 8 anos de
idade, depois que fiz uma cirurgia e aprendi a andar.”
O engenheiro disse que passou por muitas dificuldades durante a vida
escolar porque não conseguia escrever. Ele contava com a ajuda dos
colegas para fazer anotações durante as aulas. As provas eram feitas
oralmente. “Os professores sempre tiveram que adaptar minhas
necessidades, eu sempre quis mostrar que era capaz de fazer a mesma
avaliação que os outros, porém de maneira adaptada. Então,algumas
avaliações eram ditadas.”
Pensando nas dificuldades, o engenheiro elaborou, junto a equipe do
Grupo de Tecnologias Assistidas e Educacionais (TAE), do campus da
Universidade Federal do Ceará (UFC), em Sobral, os três novos
dispositivos, que têm como vantagem o baixo custo. As peças estão em
fase de aperfeiçoamento e Júnior já mira as perspectivas de
comercialização.
Dispositivos
Foi na graduação que o engenheiro pensou em desenvolver o
AdaptMouse. “Estava desenvolvendo um trabalho na Apae de Sobral. É
interessante dizer que eu tive o primeiro contato com a Apae quando eu
era pequeno, e depois voltei como professor. Passei cerca de 10 anos
desenvolvendo trabalhos e um projeto de inclusão digital.
“A Apae recebeu um incentivo financeiro para montar um
laboratório equipado com produtos adaptados. Mas não tinha o produto
para ser comprado no Brasil, então os produtos foram importados
por valores altos, totalmente inviáveis para um usuário comum.”
Ao analisar o mouse importado, Júnior teve a ideia de desenvolver
algo semelhante com custo menor. A nova tecnologia beneficia pessoas com
mobilidade reduzida nos membros superiores, como as que têm paralisia
cerebral. Em 2019, o projeto ganhou a competição Maker Challenge, do
governo do Ceará, recebendo um ano de incubação gratuita no Parque de
Desenvolvimento Tecnológico (Padetec).
“Ainda na graduação consegui desenvolver o primeiro protótipo do
mouse adaptado. Esse protótipo atendia as mesmas funcionalidades do
mouse importado, com algumas funções extras que o outro não tinha.
Terminei a graduação e, logo em seguida, ingressei no curso de
mestrado em engenharia elétrica e computação. Segui os estudos a
respeito de tecnologia assistida, que na época ainda era um tema novo no
meio científico e aí fomos aprimorando os conhecimentos”.
O projeto de pesquisa do mestrado foi desenvolver uma interface, de
acordo com Júnior. “Através do uso de sinais eletromiográficos, que são
sinais produzidos pela contração e relaxamento muscular, os sinais são
captados por eletrodos e o sistema consegue identificar qual foi o
movimento realizado, apenas pelas características dos sinais e ele
traduzia em uma ação do computador. Na ocasião, o sistema controlava um
edição de texto. Através de quatro movimentos de mão, o usuário
conseguia usar o editor para escrever palavras e dados.”
Em paralelo a essa interface, ainda no mestrado, ocorreu o
aprimoramento do AdaptMouse. “Foi feita uma modelagem em 3D e ele foi
produzido usando uma impressora 3D. Essa foi a versão 2.0. Atualmente
estou coordenando um laboratório Maker, desenvolvemos vários tipos de
tecnologia e dentre elas as tecnologias assistidas”.
Atualmente, o laboratório coordenado por Prado está desenvolvendo a
versão 3.0 e a versão 4.0 desses dispositivos. “O intuito do projeto é
que consiga sair de fato um produto que venha a compor o mercado
nacional e que chegue a tantos usuários com deficiência que necessitam
de um dispositivo que consiga fazer essa interação dele com o
computador”, afirmou.
Perspectivas
O projeto de mestrado, com a interface usando sinais
eletromiográficos, tem o propósito de continuidade, explicou o
engenheiro. “O projeto eletromiográfico para aplicação desse mesmo
sistema para controle de outras máquinas: imagine uma pessoa que perdeu
uma mão, um braço, através de sinais musculares de outras partes do
corpo poder fazer a movimentação a partir de reconhecimento do sinal.
Uma outra possibilidade para uma pessoa tetraplégica seria, através do
reconhecimento de sinais ópticos, controlar um ambiente. Tudo isso são
projetos que, com certeza, ajudarão muitas pessoas”, acredita o
engenheiro.
Atualmente, o AdaptMouse está sendo desenvolvido no laboratório do
Instituto Cearense de Tecnologia (Icetel). Essa última versão conta
com um programa de inovação Corredores Digitais, voltado para o
desenvolvimento de empresas, produtos e negócios em áreas estratégicas
da economia do estado do Ceará.
Apoiado em conhecimento científico, tecnológico e de mercado, o
programa atende a projetos inovadores em diferentes fases, de ideação à
expansão de mercado.
“Neste projeto, atuo como coordenador do laboratório e a
equipe composta por dois estagiários, Alexandre Magno e o Joel Carneiro,
estudantes de graduação de mecatrônica, que desenvolvem a última
versão, que foi uma das finalistas da primeira edição do
programa Corredores Digitais, em 2020 e 2021”