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Martinho da Vila revela que fuma desde o quatro anos



Faz mais de 40 anos que Martinho da Vila canta que “a vida vai melhorar”. Aos 81, feitos dia 12, o sambista segue encarando a vida com olhos generosos, sem se deixar derrotar pelos reveses, mas... “É difícil imaginar que vá mesmo melhorar”, diz ele à coluna, durante entrevista em casa, na Barra.

Entre cigarros, cafés e muitas risadas, Martinho — descalço e jogado no sofá — fala do desânimo com o governo Bolsonaro, lamenta a permanência de Lula na prisão e faz críticas às escolas de samba e à produção musical brasileira. Tudo sem perder a ternura, como manda o manual do boa praça — o qual poderia ter escrito.


Foto: Leo Aversa/Reprodução/Instagram
O jeito 'devagar, devagarinho' prolonga a vida?

Com certeza. Os infartos têm a ver com a vida agitada. Se já tive problemas de saúde, não me lembro. Deleto as dores da minha cabeça.

Sempre foi tranquilão assim?

Desde criança... Sempre andei devagar. Quando jogava bola na Boca do Mato, só entrava no segundo time, não passava pro primeiro. Eu não corria, jogava pra me divertir, não pra ganhar. Nunca suei a camisa. Vejo esse pessoal que até na pelada briga. Não tem lógica!

Sua mulher costuma reclamar do seu ritmo?

Ninguém pode reclamar, dizer dizer “ah, o Martinho é muito relaxado”. Olha tudo o que fiz (são mais de 50 anos de samba, 46 discos e 15 livros lançados, afora os feitos na Vila Isabel)!

Nem os anos de LPs campeões de vendagem foram agitados?

Minha vida nunca foi acelerada. Outro dia eu vi na TV um cara que fazia três shows no mesmo dia, em três estados diferentes do Nordeste. Comigo, se dissessem “Martinho, quer fazer dois shows?” Eu, não! Nunca fiquei correndo muito atrás...

O sucesso veio fácil então?

Pode-se dizer que sim. Fiz discos achando que não venderiam, mas venderam. “O canto das lavadeiras" (1989), que tem “Madalena do Jucú”, era um álbum com músicas folclóricas. Quem está interessado? Fui fazer um disco sobre a Vila Isabel, a gravadora reclamou: “Tem que fazer um disco pro Brasil inteiro!” Pois estourou. Tinha aquela “Na aba do meu chapéu...”

A idade o assusta?

Nunca pensei muito nisso. Fazer 80 é gozado, é festa. Mas quando você faz 81... é uma idade! Devo ter mais uns 15 anos. Dá pra escrever 15 livros, 15 sambas-enredo, gravar 15 discos... Minha mãe morreu com 96. Não tenho medo da morte. É uma coisa certa.

Não tenta parar de fumar?

Não fumo muito, são uns cinco cigarros por dia. Eu fumo, coloco no cinzeiro, vai queimando sozinho... Eu me habituei assim. Fumo há 77 anos, desde os quatro.

Desde os quatro anos de idade? Como assim?

Antigamente havia crianças que tinham mania de comer terra. Eu engatinhava e comia, aí me habituei. Hoje não tem mais isso, porque não tem mais terra pra comer. Minha avó dizia: “Dá um cigarrinho quando ele comer”. Era tipo um castigo. Naquele tempo não tinha isso de “cigarro mata”. Aí eu, pequenininho, parei de comer terra e gostei do cigarro. Mas nunca traguei, é como quem fuma charuto. Dá nervoso ver quem traga! Meu pulmão é limpinho. Hoje o fumante é visto como um subversivo no tempo da ditadura.

Você já foi de beber muito também, não?

Já fui muito viciado. Se não fui alcoólatra, cheguei bem próximo. Tinha muitos problemas. A gente saía pra tomar cerveja por aí e eu gostava de fechar botequim. Os caras varrendo, virando as cadeiras, e eu pedia: “Bota mais uma!” Hoje, não. As pessoas dizem que é porque fiquei velho. Mas é porque já fiz demais.

São oito filhos, dez netos e três bisnetos. Senta para brincar?

Não... Criança é bom dormindo, no parque ou na foto! Se você brinca com a criança, ela quer a vida toda: “De novo!”

Ouve música em meio digital?

O que gosto de ouvir tá difícil. Pegar um disco de um bom cantor ou compositor, acompanhar as letras. De Jorge Ben a Mart’Nália. Mas a música atual não é pra se prestar atenção, ninguém prima pela riqueza poética nem melódica. Quando vou pra roça (sua cidade natal, Duas Barrras, no interior do Rio) ouço no carro, mas a Cléo (sua mulher há 25 anos) comprou um que não tem lugar pro CD! Eu falei: “Mas num carro moderno desse?” Continuo lançando CDs porque ali tem uma conceito.
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