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Reportagem: Emílio Gusmão.
“Em sociedades como as nossas, onde tudo é efêmero, a informação voa e desaparece. A vulgaridade como os fatos são contados resulta em abandono e esquecimento, sem contexto e explicações. Vivemos com mais ruído midiático do que informação. Com certeza há certos fatos e certos momentos que constroem uma ferida, e essa ferida continua aberta e não fecha”.
O pensamento acima é do escritor espanhol, naturalizado mexicano, Paco Ignacio Taibo II. Com essa reflexão, ele inicia uma reportagem sobre o desaparecimento de 43 jovens mexicanos, moradores do vilarejo de Ayotzinapa, em setembro de 2014.
O caso que trataremos nesta reportagem, infelizmente, já está cicatrizado na opinião pública de Ilhéus. A lembrança sofrida e a saudade persistem apenas nos familiares do soldado PM Tyrone Thomaz de Aquino.
Tyrone foi assassinado no dia 23 de abril de 2017, de madrugada, numa lanchonete da Rua Bela Vista, do bairro Nelson Costa. O comportamento pacífico do soldado de 44 anos, que sequer andava armado quando estava sem a farda da PM, não correspondeu à violência do crime que lhe tirou a vida.  Quinze tiros foram disparados contra Tyrone e quatro balas atingiram suas costas.
A tragédia deixou um legado de imagens fortes e sangrentas, uma vez que a falta de escrúpulos, inclusive de profissionais da imprensa, disseminou na internet vídeos em que Tyrone agoniza ferido e desesperado em seus momentos finais.
Passados quase dois anos da execução, o crime continua insolúvel. Os dois assassinos chegaram na lanchonete vestidos com casacos pretos e cabeças envolvidas por capuzes.
Nas proximidades não havia câmeras de segurança que pudessem fornecer imagens à investigação.
A principal testemunha do caso, Danilo José Silva Santos, presa menos de 48 horas após o crime, disse em depoimento à delegada Andréa Oliveira que a morte foi encomendada por Adailton Soares dos Santos (Dai), líder da facção Raio A, na época encarcerado no complexo penal de Itabuna.
Conforme relato de Danilo, Fabrício Santana Caetano (Beiço) e um homem conhecido como Everton mataram Tyrone. Eles receberiam dois mil reais e um quilo de maconha pelo crime. Um terceiro envolvido, Fabrício Magno de Santana (Testinha), teria dirigido o carro que propiciou a fuga dos executores.
Como não houve prisão em flagrante, a delegada Andréa Oliveira foi obrigada a liberá-lo. Depois que saiu da delegacia, Danilo foi assassinado misteriosamente na Avenida Princesa Isabel. O taxi que o transportava foi emparedado e homens não identificados atiraram nele.
Após o depoimento de Danilo, os suspeitos foram mortos ou desapareceram.
Dai, o suposto mandante, foi morto em Vitória da Conquista no dia 29 de outubro de 2017. Ao tentar matar o filho de um cigano, recebeu tiros da reação implacável de um segurança e não sobreviveu.
“Beiço” morreu no dia 11 de outubro de 2017 após confronto com a Polícia Militar. Exame realizado numa pistola 380 encontrada com ele, não indicou relação com o crime.
Testinha desapareceu de Ilhéus. Informações desencontradas afirmam que ele pode estar em Brasilia (DF).
Outro suspeito, Pippou Cleber Machado dos Santos, foi assassinado em Uruçuça.
Cristiane Soares, mãe de Dai (líder do raio A), também sumiu de Ilhéus. Ela acompanhava o marido Danilo, no dia em que ele foi emboscado na Avenida Princesa Isabel. Segundo a delegada Andréa Oliveira, ela tinha várias passagens na delegacia e abandonou o apartamento que morava no Condomínio Moradas do Porto.
O suspeito de primeiro nome “Everton” jamais foi identificado.
Com as sucessivas mortes e desaparecimentos, a investigação não teve tempo e condições para apurar se o depoimento de Danilo era verdadeiro.
Delegada Andréa Oliveira, do núcleo de homicídios da 7ª Coorpin/Ilhéus. Foto: Emilio Gusmão.
A delegada Andréa Oliveira disse à reportagem do BG que a esperança de solucionar o caso está no resultado do exame feito numa arma encontrada com um homem chamado Felipe Ariel. Trata-se de outro suspeito que não pode ser incriminado, pois o Departamento de Polícia Técnica (DPT) ainda não disponibilizou o resultado.
A delegada também revelou que dias antes de ser assassinado, Tyrone fez carga de uma arma de fogo da PM, para uso fora do serviço, procedimento poucas vezes registrado no histórico dele.
Uma névoa de mistério ronda o caso. Um policial militar, servidor da segurança pública, foi brutalmente assinado e o Estado não oferece condições mínimas para que o crime seja resolvido.
O apelo ao esquecimento está feito. A impunidade tende a prevalecer e só restará a memória das pessoas que gostavam de Tyrone devido ao seu jeito tranquilo e gentil.
Soldado PM Tyrone.
No peito aberto dos seus amigos e familiares ecoa o canto e a letra de Milton Nascimento, na música Sentinela.
“Longe, longe, ouço essa voz
Que o tempo não vai levar”.


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